Nas paredes
desbotadas e azuis, escorria pelos caminhos desta uma gota d’água, provida da
chuva da noite anterior, ela corria junto à umidade e soltava-se rumo ao chão
de terra que a absorvia. Seropédica era uma vila serena que expirava a natureza
em seus ares. Os campos pela manhã abandonados à melancolia pareciam não se
frutificar. Os pássaros cantavam, outros omitiam sua liberdade, nenhum estava
morto. Seropédica acordara...
- Antônia, o café
já está à mesa?
A escrava vira-se e
em voz cansada responde-lhe:
- Oh, dona
Mercedes, já está na mesa sim.
Mercedes, herdeira
das terras de Seropédica, com um olhar vago, se desloca à sala-de-jantar.
Senta-se na cadeira estofada com estampas lisas e revestida de veludo. Com
cabelos penteados, face alva e olhos claros, esta nem concede à escrava uma
palavra de boa fé.
Ao primeiro gole,
Mercedes depara-se com um líquido muitíssimo quente, isso a faz repreender a
escrava:
- Antônia! Sua
crioula dos diabos, como me fizera algo tão infernal, faça o favor de... - num
ímpeto de ira, o café acaba se espatifando no colo da senhora. - Sua preta!
Olha o que me fizeste! Não serves para nada! Trate de me arrumar novas
vestimentas.
E num gesto rápido,
Mercedes dirigiu-se ao quarto para se limpar. Repara que, ao chegar no
aposento, seu gato estava em devaneios sobre a penteadeira, o pelo liso e negro
se roçava à beira do espelho. Mercedes o enxota, fazendo-o correr e se acomodar
junto ao pé da cama. Com seus cabelos exímios, a filha do Conde Vicente
senta-se à frente da enorme penteadeira, serra os olhos por instinto e leva as
mãos aos fios negros e brilhantes, como os do gato, que estava a invejá-la.
Quando a escrava
Antônia adentrara ao quarto, carregava consigo panos e vestimentas limpas e
secas; Mercedes estava com a roupa de baixo. Um silêncio se fez durante a longa
troca de olhares entre criada e senhora, e logo após Mercedes o rompe:
- Oh pretinha dos
infernos! Será que é pedir demais para que você veja-me horrenda neste estado.
Corra, ajude-me.
A negra encabulada
em seu vestido maltrapilho apressa-se até Mercedes e se põe a umedecer os panos
e limpá-la.
O primeiro toque
entre as duas, depois de quatro anos de servidão, fez Mercedes arrepiar-se,
talvez a água fria tenha lhe proporcionado isso.
Antônia sem ao
menos pedir licença à dona, levanta-lhe a vestimenta de banho e começa a
enxugá-la com as toalhas umedecidas. Mercedes pensava em chamar-lhe a atenção,
porém sentia-se estranhamente bem com a escrava lhe tocando ao pé dos seios.
Antônia percebera
que Mercedes voltava o pescoço para trás como se estivesse em começo de
delírio. A escrava, com uma mão sobre o estômago da dona, iniciou a colocar a
outra sobre o ombro dessa. Estes estavam nus e macios, sendo admirados pela
coloração extremamente clara, com ares de pureza. Numa ação rápida e ao mesmo
tempo revestida de impotência, Mercedes levanta-se e embebida de volúpia beija
a escrava. Antônia, carregada de impulsos paradoxais, sem saber o que era certo
ou errado, abre a boca pensando em relutar e dizer-lhe que não era bom que
fizessem aquilo, porém, nem para isso teve forças, e numa saída violenta e
acanhada, se pôs a correr quarto a fora.
Esperamos ansiosas o próximo capítulo
ResponderExcluirTambém estamos ansiosos para postá-lo, obrigado por seguir nosso blog. (:
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