O piso de madeira
entoava passadas contínuas, tendo, ao término do ciclo, um rangido em suas
entranhas. Em cima deste, Antônia vagava em estado de pânico de um lado para o
outro, seus pensamentos estavam confusos, ela ordenava a razão a ter fuga de
tudo aquilo, porém a sua mente já havia se rompido com a descoberta de uma
ânsia cheia de mácula.
Cravada em uma de
suas intermináveis voltas ao redor de sua cama, ela estaca todo o seu corpo, e
num arrepio curioso que lhe corta a nuca, a maçaneta do quarto range, sofre e
acaba se abrindo. Na corrente de ar que invadiu os aposentos de Antônia,
encontrou-se o odor floral de sua dona. Mercedes estava ofegante, com a boca
semiaberta levou os olhos a escrava, que parecia estar diante de algo
mortífero.
Antônia,
descendente de quenianos, mulata forte e de cabelos marrons, sempre fora
submissa e obediente, porém, no dia em que Mercedes abrira a porta de seu
quarto, esta brotou de uma maneira louvável, como um lírio que floresce antes
de nascer ou até mesmo um ser escrupuloso rumo à morte.
As duas se
entrelaçaram num redemoinho de êxtase, beijaram-se com ardência, queimava-se o
lugar mais obscuro de suas almas, sentiram-se numa metamorfose idílica,
tornaram-se uma só com o suor do pecado da carne, eram estrelas na terra
refletindo suas luzes uma a outra, eram criadoras do universo, deias alumiadas
pela flama da paixão. Tiveram o seu tempo de amor consumado em algo irreal, que
nenhum escritor poderia relatar.
No fim da tarde, as
duas, deitadas com seus corpos nus, acariciavam-se dizendo palavras da mente,
mostravam um lado uma a outra nunca descoberto nem por elas mesmo.
No momento em que
os olhos de Antônia observavam as auréolas burguesas de dona Mercedes, o marido
desta bate a porta da entrada:
- Mercedes, cheguei
minha flor! - virou-se ao ajudante - Pretinho! Vá sacar a sela do corcel...
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